segunda-feira, 30 de maio de 2011

O Velho

Condição na competição:
Vice Campeão
Venceu:
1 Campo Platônico
Data de Nascimento:
03/09/1960
Cidade:
Macaé, RJ

Profissão:
Professor de Artes
Partido político:
Não possui.
Gosto literário:
Beto Miranda, Maiakovski, Pablo Neruda, Manuel Bandeira, Mário Quintana, Chacal.
O que significa vencer este concurso?Para O Velho, a participação neste concurso significa uma oportunidade de difundir seu trabalho, tê-lo apreciado por um número maior de pessoas e receber críticas de pessoas gabaritadas para tal.

Porém, o objetivo de O Velho é ser publicado em uma antologia poética, sobretudo pela Multifoco, que se trata de uma editora de imensa penetração no mercado.
O que o tempo representa para O Velho? 
O tempo é como um grande livro onde tudo o que existe vai sendo escrito, pois ele já existia antes. O tempo é o grande senhor de todas as coisas.

Poema n° 1 (pré seleção): o quintal

No quintal da minha casa
quando, às vezes, me distraio
pardais dividem os pedaços de pão
colocados ao acaso
sempre no mesmo lugar
no quintal da minha casa...

no quintal da minha casa
quase todas as coisas tem asas
borboletas sobre margaridas e flores do mato
gafanhotos que devoram bertalhas
e toda a imaginação que voa à solta, sem pressa
no quintal da minha casa...

no quintal da minha casa
o peito arde em brasa
quando penso em fazer nada
ouvindo uma música silenciosa
tocando insistentemente
entre a mangueira e o banco da varanda...

no quintal da minha casa
me entorpeço com o cheiro da erva cidreira
olho o verde das bananeiras
às vezes, repico o sino
só pra quebrar a maravilhosa monotonia...

contemplo parado meu jardim
de trevo de quatro folhas...
esmiuço os mais longínquos
cantos do pensamento
e tento organizar o quebra cabeças
da minha memória
remonto todas as fases emocionantes
da minha história...

me aborreço e me alegro
no caminho de pedras
que montei enquanto chovia
e eu cantava
no quase perfeito
lado direito
de quem entra
do quintal da minha casa

Poema nº 2 (Top 17 - O Velho e o Tempo): apenas saudade

um velho
se debruça
sobre suas memórias
revira
os arquivos das lembranças parcas
contempla o crescer
de árvores, flores, matagal
procura antever as raízes
sob a terra  fértil
e o pensamento caduco...

já escrevia
poesias líricas
histórias lúdicas
antes das palavras
serem inventadas...

a pedra pintada
veio muito depois
a arte ainda não existia...

chora pelo tempo derramado...

o tempo não nos poupa
não nos espera trocar de roupa
não guarda lugar na fila da juventude
que há muito, amadureceu no pé da vida...

“-estranhamente
não me reconheço em mim
sei de onde venho
mas parece que não tenho fim...”

de olhos vermelhos
corre pro espelho
na vã tentativa de se encontrar:
e lá está ela
a sua imagem
mas não é ele
não ri de si própria
não tem autonomia
é um arremedo de si
triste e breve alegoria
da sua efêmera vida vazia...

ancora-se frouxo
num pensamento ordinário
de um tempo imemorial
que lhe trouxe espanto...

o branco em seus cabelos
as rugas no seu rosto
não fazem do tempo
um personagem confortável
antes disso, cruel e voraz ...

e num acesso de raiva lúcida
decide nunca mais dar corda
em seu  relógio de pulso
pois velho como ele
já não aguenta mais
a correria insana e impiedosa
do tempo
impetuoso desembestado...

o velho
sem dor
sem medo
sem mágoa
sem pressa
atravessa sua vil existência
na esperança de um dia
ser apenas saudade...

Poema nº 3 (Top 15 - Haicais): hemerocale

flor: vive um dia
e antes do seu ocaso
vira poesia.

Poema nº 4 (Top 13 - Crítica Social): é hora

passou o tempo da guerrilha
do protesto, da vigília
já não cabe o besteirol, a piada
a poesia, a passeata
já não dá pra se afogar
no fundo de um copo...

é hora do fazer,
do dedo onde mais dói:
no voto.

Poema nº 5 (Top 11 - O Sertão): ser tão

por ser tão árido,
de  solina densa,
de natureza íntima,
de coisas miudas,
de espaço vasto,
de vargem rachada,
de dura lida,
de terreiros limpos,
de silêncio de bicho,
de sabedoria de pedra,
de arribação de pomba,
de farinha no prato,
de lentidão do tempo...

por ser tão ressequido,
de pintada na espreita,
de teiú na buraca,
de umbuzeiro carregado,
de gibão de couro de vaca seca,
de oiticica frondosa,
de cangalha no lombo,
de azagaia nos raios do sol,
da légua tirana,
de lama na cacimba,
de espinho na carne...

por ser tão distante
dos meus verdes olhos urbanos,
tudo parece tristeza larga
de peito apertado,
de choro baixinho,
de dor pungente...
mas celebro a vida,
a dura vida reta
dos derradeiros cantões do Brasil...

busco versos escassos de plenitude
e sorriso na poesia seca, sem rima...

Poema nº 6 (Top 9 - Poema baseado em imagem): carregamentos móveis 

“e agora José?
José, para onde?”

leve seu fardo
sem sentido
nesse paradoxo
comovido
do tortuoso cotidiano.

esmiúce sua caixa
de parco repertório:

Quixote abnegado,
Teseu urbano,
novelo degelo,
argonauta inglório...

Poema nº 7 (Top 7 - Poema em homenagem ao autor favorito): Vladimiravel Maiakóvski

desmetri
            fica
               da
                 mente
semeada
           pelos
                Campos
da
  megaroa
           concretacidade

verso martelo
                 convite ao berro
                                      de-sa-cato

falando
         versos
                nunca
                       fatos

versos de tundra
                     oriunda
                           do crânio-gênio
                                           apinhado-apanhado
                                                                 hiperbólico

uma letra
           alarma qual trombeta
                                    estronda feito bomba


ri                      ou
mas                  tu
ve                     bro
ras                    ou
mas                  cu
ri                      bo

coloquial
           moderna
                  (por hora
                             arcaica)
sui-ci-dado
            (sem bilhete
                            com balido)
por uma
             bala
                   laica.

Poema nº 8 (Top 5 - Soneto): como nasce um soneto

como se faz  pra  escrever um soneto?
quanto de tempo seria necessário,
se toda vez que abro meu armário
me deparo com mais um esqueleto?

cato letras sopradas pelo vento
espalhadas no largo do universo,
pouco a pouco componho cada verso
ao mesmo tempo em que me reinvento.

me alimento de sensibilidade
me despindo de toda vã vaidade
superando meus traumas, minhas dores.

meus amores ficaram na saudade,
nunca mais eu vi a cara da verdade,
os poetas são todos fingidores.

Poema nº 9 (Top 4 - Pai - Uma Homenagem): sou meu pai 

madrugada lenta,
luz difusa,
espelho rachado.
em cada pedaço
do tempo em estilhaço
susto posto no rosto:
sou meu pai!

em rugas cínicas
saudade que não há,
no claro dos olhos
conselhos não dados,
no branco longo da barba
medos não curados,
sob o calvo da cabeça
poesias que não dediquei...

só entendi
sóbrio e solene
em minhas falhas
e minhas filhas
que ora vagueiam
no eito imperfeito do mundo,
levando junto
meu coração
intenso e farto
que descompassa confuso
(nelas)
fora de mim.

Poema nº 10 ("Ai, o amor... Hum, o sexo!"): namorada (Poema de amor)
a noite adormece cedo
o sonho dorme demais
o tempo é um brinquedo
o farol não acende o cais...

lá fora, o escuro, o medo
mas conheço os teus segredos
bem na flor desses cabelos
num sorriso acidental...

sou dos mares
que partem portos
da terra seca
que come corpos
não deixo nada pra trás...

sob o pano negro da noite
em todas as luas nascentes
teus olhos acordaram a luz
na-morada dos teus olhos
todas as luas azuis.
Poema nº 11 (Top 3 - "Ai, o amor... Hum, o sexo!"): navegante (Poema erótico)
parto do porto dos teus olhos
em nau de velas cheias
quase naufrago imprudente
no mar vermelho da tua boca.

circundo o arquipélago
dos seios de bujarrona
rodamoinho no umbigo
sigo singrando
por negras algas
até à gruta alagada
encimada por farol.

já no outro oceano
maremotos alquebram
a mim e ao meu barco
frouxos, fracos
e lá, no abismo abissal
já não há velas
nem convés
nem casco
restou de pé
o mastro.


Poema nº 12 (Grande Final - "Fragmentos da solidão contemporânea"): tempos modernos

um sol ardendo no seu peito
abrindo em corte a solidão,
homem discreto, pretérito, perfeito,
controle remoto:
seu destino em sua mão...

na esperança de encontrar um caminho,
agoniza, desvenda fronteiras
no mouse manchado de vinho,
numa cadeira vazia ao lado
esperando alguém...

passam musas ao sabor do monitor,
dentro, em si, um h. d. vazio,
mais de mil amigos em redes sociais
correndo na contra mão sobre um rio...

você explode no blog do bar,
faz upload na melancolia,
tudo se acha pelo iphone:
poemas do Bloba, comida, remédio...
mora no prédio cercado de grades:
Residencial da Felicidade...


Poema nº 13 (Grande Final - "A Poesia"): me oriente


(para Paulo Acacio Ramos e Stella Monteiro)

poetar:

longe do mundo,
revira-se armários
do tempo,
prateleiras da memória,
esqueletos tão secretos
desmontam no colo
de sílabas compulsivas,
palavras impossíveis,
em versos de azulejo
e rimas de porcelana
num comboio de letras
lentas, tontas, lúgubres...

se um poeta
que me oriente
parar de escrever
em Tóquio
e o mundo parar junto,
mesmo exausto,
seguirei como o único
a tentar entender
minha musa
constante e caprichosa:

a poesia.


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