sábado, 28 de agosto de 2010

"Céu de fogo" - preload


As luzes ainda lhe ofuscavam os olhos. Remexia naquela única gaveta embutida na parede de uma sala redonda, imensa e vazia. As paredes brancas refletiam a luz exagerada do teto e davam a impressão de que a sala toda brilhava. Suas mãos trêmulas encontraram a pequena pasta com seu nome completo e foto na capa. Quando abria para ver seu conteúdo ouviu passos atrás de si.
Os dois homens olhavam-lhe confusos, parecia completamente impossível que ela pudesse estar ali, depois de algum receio, correram em sua direção. Ela ficou um momento paralisada e imaginou que os dois poderiam pelo menos não ser tão grandes e fortes quanto os seguranças que via nos filmes, mas seus passos quase faziam o chão estremecer. Tentou afastar esses pensamentos e planejar uma fuga, a saída para a escada ficava a cinco metros de onde estava mas eles poderiam chegar até la tão rápido quanto ela, não havia chance de fugir a menos que pudesse atrasá-los. Foi então que viu o pequeno interruptor ao lado da gaveta, um lugar muito incomum para se achar que ele acionasse as luzes mas não custava tentar.
Para seu alivio, as luzes se apagaram gerando exatamente a escuridão que imaginava, seus olhos, acostumados com o brilho ofuscante, não enxergavam mais nada à sua frente, os homens também hesitaram por um momento diante da escuridão e ela aproveitou para correr em direção a única e pequena luz existente que vinha da escada.
Apesar de conseguir alguma vantagem ao apagar as luzes, eles já estavam em seu encalço e eram muito mais rápidos, tentou forçar um pouco mais, pular de dois em dois degraus mas era inútil. A escada em caracol parecia interminável. Com a proximidade dos perseguidores, entrou em desespero e passou a descer em grandes saltos até que em um momento, percebeu que seus pés não tocavam mais o chão, mergulhava pela escada abaixo cada vez mais rápido.
O momento de alívio dessa descoberta durou pouco, atrás dela, os dois homens também voavam e se aproximavam de novo, à sua frente surgiu o fim da escada e uma porta, mas antes que pudesse alcançá-la uma mão segurou seu calcanhar. Ela soltou um grito e sua visão começou a escurecer-se.

Abriu os olhos atordoada, o rosto já vermelho de vergonha. O suor escorria de sua testa enquanto olhava à sua volta procurando por testemunhas. A biblioteca estava vazia como sempre e dona Lúcia cochilava em sua mesa, suspirou aliviada e, mais uma vez, prometeu a si mesma não ler mais tantos romances policiais seguidos. Alena levantou-se, o rosto marcado pelo livro sore o qual dormira, pegou-o e caminhou lentamente até as poucas e velhas estantes amontoadas num canto. Ao voltar, checou a cesta na cadeira ao lado, estava vazia, alguém havia se aproveitado de seu cochilo para roubar os últimos bombons. Deu de ombros, com uma sensação de alívio, não queria mesmo que eles estivessem la. Procurou pelo dinheiro arrecadado na manhã em seu esconderijo dentro da bolsa, estava lá. Satisfeita, pegou suas coisas e foi em direção à porta, olhou para dona Lúcia e pensou se deveria acordá-la, mas decidiu deixá-la descansar um pouco mais, a tarde para ela não seria tão silenciosa quanto a manhã. Ao sair, mudou a plaquinha improvisada de cartolina para “fechado” e pendurou-a de volta na maçaneta, virou o corredor e abriu a próxima porta, que dava para o caos exterior.
Atravessou o pátio até o portão do colégio, apesar de não ter muitas pessoas, a desordem habitual estava presente, em um canto, duas garotas se socavam espalhando gotas de sangue, cercadas de rapazes enlouquecidos que gritavam incentivando a briga. Nas mesas à frente, elementos um pouco mais civilizados berravam jogando cartas. Parou de olhar para os lados temendo arranjar confusão, e saiu em direção ao vento abafado da rua.

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