segunda-feira, 29 de março de 2010

Celebrar a Vida

Luz terna que vem de dentro. Cor de aconchego.
Mesa sugerindo encontro.
Encanto fora. Bancos que anseiam sua companhia.
Grama e tecido, chão macio.
Para pisar inteiro, sentido.
Alimento, que do se come, faz-se vivo.
Fios de sustento, frágeis o bastante para cair a qualquer momento, num abraço.
Flexibilidade, mobilidade, versatilidade, simplicidade, luminosidade, não sei...
Sei que é lindo.
Não sei a palavra que eu queria dizer.
Sei os sentimentos que quis evocar. Num canto cigano de profunda alegria.
Da primeira vez até a eternidade.
Seja bem-vindo! Estou/sou feliz com sua chegada!
Vamos então, celebrar a Vida!

PS: Não conheço os direitos autorais dessa imagem, mas posso colocar os créditos se você souber. Quem a fez, foi simplesmente brilhante! Obrigada. Beijos,
Crédito descoberto: Foto de Dan Duchars (Parabéns)
Claudia

Chandeen - Welcome the Still

Essa é uma banda maravilhosa que eu adoro e que me inspira muito

domingo, 28 de março de 2010

Soneto clássico digitado com uma máquina de escrever de uma tecla só

Hhhh hh hhhhhh hh hhhhhh hhhh
Hh hhhhhh hh hhhh hhhh hh hhhh
Hhhh hh hh hhhh hhhh hh hhhhhh
Hhhhhh hh hhhh hh hhhh hh hhhh

Hhhh hh hhhhhh hhhhhh hhhh hh
Hhhh hhhh hh hhhhhh hh hhhhhh
Hhhhhh hhhh hh hh hhhh hhhhhh
Hhhhhhhh hh hhhh hh hh hhhhhh

Hhhh hh hhhhhh hh hhhh hhhh hh
Hhhhhhhh hh hhhh hhhh hh hhhh
Hhhhhh hhhh hh hh hhhhhh hhhh

Hh hhhh hh hhhhhh hhhh hh hhhh
Hh hh hhhh hh hh hhhh hhhhhh hh
Hhhhhhhh hh hhhh hhhhhh hhhh

sábado, 27 de março de 2010

Se você não passa no morro...

É curioso como algumas músicas que, aparentemente, não "querem dizer nada", soam um significado muito interessante, e às vezes até engraçado, em determinados momentos. Acredito que quase todos devem ter ouvido os "bla, bla, blás" em torno do jogador Adriano, do Flamengo. Uma das polêmicas que envolvem o jogador é o famoso "cavalo de Tróia": ele teria presenteado, segundo a polícia, a mãe do traficante Mica com uma moto. A velha nem andar de bicicleta anda (sobretudo pelo risco de perder os freios na descida do morro, né...). Apesar disso, continuo acreditando na versão do Adriano não porque sou flamenguista, mas porque o astro do futebol preserva suas origens, não esquecendo dos seus, embora tenha conquistado uma enorme fama no mundo milionário do futebol. Ele não tem culpa que um grande amigo seu enveradara-se por caminhos errados. Discordem do ditado "quem anda com porco, farelo come". Quantos amigos fumantes nós temos? E por isso fumamos? Mas, voltando ao "play" da música... Eu não poderia perder a oportunidade de fazer essa piada. Assistam a esse clipe (que por sinal, é maravilhoso), atentando para a letra e para os óculos escuros... (o que eles escondem?). Não seria essa música que o Mica e sua ''radical mother'' estaria cantando para um Adriano "em abstinência"? Bom final de semana a todos!

(Passe em casa, Tribalistas)

sexta-feira, 26 de março de 2010

On/Off

Quando me liguei,
Já estava ligada.
Quando desliguei,
Permaneci ligado.
Quando me deitei,
Eu a programei.
Quando me levantei,
A sua tecla eu apertei.
Quando enjoei,
Uma maior eu comprei.
Ei!
Por que meu rosto está pálido?
Por que me sinto um inválido,
Entrevado aqui, neste sofá,
Movendo apenas alguns dedos?
Por que agora sinto mais medo?
Acho que a fantasia está lá fora.
A realidade invadiu a minha casa.
Uma viagem pode ser mais sensacional
Do que qualquer notícia desse Jornal Nacional
Que me importa a vida do presidente
Se a minha anda ausente,
Se a minha anda, nem sei por onde.
Hoje sai com uns amigos
Eles falavam de cientistas
Flaubert, Balzac, Goethe...
Já não consigo me encontrar.
Foi somente através dela que vi o mar.
Ela transmite o que costumo sonhar.
Como me libertar?
Ela não faz eu me sentir só...
E isso é só uma ilusão.
Uma ilusão de óptica. Uma atração hipnótica.
O processo é oposto:
Sua vida é a cores.
Minha vida é preta e branca.
Tarde demais.
Quando eu me liguei... Ela já estava ligada.

segunda-feira, 22 de março de 2010

22 de Março - Dia da Poesia

FAÇA DE SUA VIDA UMA POESIA.




"A poesia é a música da alma, e, sobretudo, de almas grandes e sentimentais."
(Voltaire)

Com quais palavras você se despe?




Veio disposta a se despir. Fazer um strip tease da alma.
Primeiro,suave como um gato foi se desfazendo de toda vergonha por estar alí prestes a verbalizar.
Em seguida, começou a nomear todo sentimento que já começava a transbordar:
Como um véu,caiu primeiro a raiva, que depois de passar dias olhando para um telefone que nunca toca, causou lhe uma tarde inteira de dores do estômago.
Depois a insegurança, que junto com o ciúme, negativou seu crédito e sua auto-estima.
Respirou fundo, era dificil se desnudar daquela forma, mas o único jeito de se fazer entender, era dando nomes aos seus sentimentos e jogando os em cima daquele homem, como uma luva ou uma meia de renda...
Se desfez da lucidez e derepente se despiu do sexo, de todas as noites maravilhosas que passaram juntos e seguindo a mesma linha, corajosamente conseguiu admitir que nenhuma noite teria sido tão boa sem o amor. Que tudo havia começado de forma inesperada, casual, mas subitamente estava ela alí, amando e querendo ser amada por ele.
Ainda faltava a saudade, que ela jogou no colo dele e a responsabilizou por toda aquela cena, por toda insensatez desmedida e falta de pudor. Era tudo culpa da saudade desesperada, que foi só a gota d´água que fez com quem essa avalanche de emoções soterrasse a razão.
Não esperou resposta. Estava nua em meio a um bar lotado,sua bebida já havia esquentado, não tinha mais nada a perder, levantou e o deixou.

domingo, 21 de março de 2010

Fazer arte


Tear
Tê ar
Ter ar

Ar ter
Ar tê
Arte

sábado, 20 de março de 2010

Doravante


(Gustav-Adolf Mossa, Elle, 1905. oil on canvas)

Dora, avante
Dora, adore
Doravante
Dora, cante
Nossa canção
A dos amantes
Doravante
Avante, Dora
Adora, Dora
Cante, Dora
Doravante
Sinta dor, Dora
Adore
A dor e o sofrer
Doravante
Felicidade nasce
Num instante
Dora, espante
O mal que vem de antes
Doravante
Dora, encante
Meu coração infante
Dora, arroga
Meu rogo arrogante
Dora, adora
Doravante.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Saldo negativo

Saldo (afetivo) negativo!
Ninguém a havia ensinado a calcular e cuidar de sua conta afetiva.
Estava com o saldo negativo há muito tempo.
Foram os não reconhecimentos, os poucos incentivos.
Ela mesma negava os bons afetos que causava, depositando-os em contas alheias.
(Acontece sempre de pouparmos para o outro e esquecermo-nos das reservas que necessitamos).
Um dia ela acordou diferente. Foi depois de um susto ao ver como andava vivendo ultimamente. Decidiu que não precisava ser tão complicado. Foi lá e olhou a sua conta. Tirou um extrato fiel dos seus dias.
Perguntou para os seus sentimentos... Eles sabiam bem da sua situação econômica emocional.
E eles perguntaram para ela: -“Tem sentido muita tristeza? Andou sentindo solidão? Tem feito mil coisas e esquece sempre de você? Está correndo feito louca para cobrir o dia?...
Se respondeu sim a pelo menos duas dessas perguntas, corre e deposita.
Como essa conta é só sua, só você pode movimentá-la e a senha é secreta, para sua garantia... Ufa!
Então vai lá... Correndo!
Deposite um pouco de ternura para você mesmo. Deposite tempo, coisas feitas com qualidade. Com sentido.
Não pague alto por momentos que na verdade não acrescentam nada a sua vida, mas a retiram de si mesma. Ou melhor, pague alto somente se souber o que está fazendo. Por sua conta e risco.
Observe se, para estar com algumas pessoas, precisa ficar sem um tostão emocional.
Identifique as relações (pessoais, de trabalho, de estudo) que aumentam sua riqueza, e reserve...
Quando nos colocamos inconscientes do nosso saldo afetivo rua afora, normalmente voltamos ainda mais negativos.
Porque o outro não sabe sobre nossa condição. Mas se você for consciente de seus poderes, poderá arriscar uns investimentos mais ousados, lembrando que riscos são riscos, ganhar e perder são dois lados da vida...
Aí, mais nada nem ninguém será causa de seu lamento. Porque não poderão tirar o que você não tem. E o amor que você der, será livre e leve."
Ela guardou aquele conceito para usar todo dia. Antes de sair de casa pensava nas aulas de economia, ecologia, psicologia, religião...
Todos os saberes ensinam a mesma coisa... É preciso reinventar, reciclar, poupar, pensar na sustentabilidade, agir responsavelmente.
Perder já não é uma atitude inteligente. É preciso planejar.
O que nunca pensou é que usaria esses conceitos com seu próprio coração.
Feito do mesmo pão de todas as mesas... Afetos precisam ser saboreados e partilhados. Nunca perdidos.

Beijos de ótima semana, cheia de vivências positivas.
Claudia Chaves

domingo, 14 de março de 2010

Minha autopsicografia


Fingidor
Finge dor
Finge completamente
Finge completa mente
Fingir dor
Deveras
Deverás

Lê... escreve
Dor lida
Dolorida
Com a dor lida
Duas teve
Não tem

Roda
Giração
Razão
A corda
Acorda
Chamas
Coração

Tu (áudio)

sábado, 13 de março de 2010

clAMOR

Amigos leitores,
Quero anunciar que, a partir desta semana, passarei a realizar minhas postagens aos sábados. A autora s/a Karina me substituirá nas segundas-feiras. Obrigado, Lohan.

“O amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói e não se sente, é o contentamento descontente, é dor que desatina sem doer” (Camões).



Por que secas, oh flor?
E não te deixas molhar!
E este orvalho, que é lágrima
Pende de tua árida pétala

“Se perder um amor... não se perca!
Se o achar... segure-o!
Circunda-te de rosas, ama, bebe e cala.
O mais... é nada” (Fernando Pessoa).


Por que a Via Crúcis no Éden?
Por que ser poeira, e não pólen?
Germinar a vida,
Enquanto nos é dada a vida
Semear o amor, mas não somente em palavras:
Em atos, em fatos.
Gerar a lembrança futura de um antigo retrato
Um retrato da felicidade que hoje podemos.

“Vós, que sofreis, porque amais, amai ainda mais. Morrer de amor é viver dele” (Victor Hugo).

Por que este espírito embrutecido,
Mal lapidado de prismas de luz?
Por que essa armadura pesada,
Essa afiada espada,
Se todo Império tem sua queda,
Exceto o do amor.
“Só amor conhece o que é verdade”,
Por que viver no próprio engano
Dos teus passos?
Ser um podendo ser dois
Ser dois e sendo um
Um olhar e um coração
Voltado para o sentimento que mais se faz existir
E que, ao mesmo tempo,
Menos é acreditado
Menos é buscado,
Menos é sentido.
Tudo sem sentido.

“Amar, porque nada melhor para a saúde que um amor correspondido” (Vinícius de Moraes).

Abra os olhos, enfim:
O amor está agora em seu pensamento,
E em seu peito,
Seja o esquerdo, ou mesmo o direito.
Ele angustia, ele sufoca,
Ele clama por liberdade.
Se tiveres de morrer, morra ao lado meu,
E não sozinha, asfixiada pelo amor teu.
Enquanto houver alguém que clame
Há de existir alguém que ame.

“O tempo é muito lento para os que esperam
Muito rápido para os que tem medo
Muito longo para os que lamentam
Muito curto para os que festejam
Mas, para os que amam, o tempo é eterno” (W. Shakeaspeare).

terça-feira, 9 de março de 2010

Gabriela




Gabriela,
Olhem os olhos dela
Louca ou donzela,
Gabriela
Quem consegue viver
Sem ela
Quem não repara no azul
Dos cabelos dela
E do verde, dos olhos,
De suas faces amarelas
De sol, do ouro,
Das minas de Minas
Não existem as rimas
Sem Gabriela
O corpo, o sopro,
O piscar, o falar.
Quem não ouviu ela dizer
Salve o azul do mar
Salve o azul do céu
Que contemplo da minha janela
Salve o azul da paz
Que sinto quando vejo
E desejo
Gabriela...

segunda-feira, 8 de março de 2010

Faceira

Sou quem ri e quem chora
Quem tem medo e quem ora
Simples e abrangente, intensos afetos me deixam contente
Incoerências aqui e ali no desejo de fazer sorrir
Crescendo a cada instante, criança que não quer partir
Beijo, braço, afago... Gestos que posso dar
E oferecendo o que sou, eternamente a ganhar
Esse é o fato, meu pequeno grande abrigo
Tudo em mim começa na beira de um sorriso
Mais que mulher, feminina. Mais que menina, guerreira
Lutando pela dignidade do mundo de salto alto e batom
Menina. Mulher. Faceira!

Meu dia é o dia de todo mundo. Dia em que o sentimento trabalha na mesa ao lado da razão.

domingo, 7 de março de 2010

MULHER




Mulher sou eu, é ela, É AQUELA,
Que desperta, transgride, transcorre...
Mulher é aquela, é ela, É VOCÊ,
Que faz da espera áspera, letra doce, cadenciada...
Que engole a agonia, que se refaz todo dia, que disfarça o choro e cuida da cria...
Que se perfuma para quem não vai chegar, mas que nunca deixa de acreditar.
Que morre e renasce todos o dias, pois tudo em nós dói mais fundo, sentimos na carne toda a dor do mundo...
Mulher é ela, é aquela, SOU EU, que preciso me reinventar todos os dias, porque é difícil ser criatura epidérmica em um mundo onde para se sobreviver é necessário demonstrar menos amor, menos sensibilidade, senão te atropelam, te devoram... Ser vísceral te arranca os olhos, a entrega, parte o seu coração.
A mulher que eu, ela e você somos, é acima de tudo, aquela que trasnforma toda escara adquirida em felicidade de uma forma ou de outra, construída.

anjo gauche

Quando nasci, um anjo gauche
desses Carlos que vivem na sombra
disse: Vai, Edson! ser torto na vida.

sexta-feira, 5 de março de 2010

JE VEUX






Eu só quero que você me queira...
E assim sendo, quero te querer também....
Sem ter mais aquele medo gelado,
De desejar tudo em vão...
Não quero mais desdenhar meus anseios,
Pelo simples medo de vê-los esvaindo-se
Pelas minhas mãos...
Eu quero querer sem temer,
Eu quero poder esperar,
Quero ter coragem o suficiente para acreditar
Que às vezes as nossas expectativas são correspondidas...
Eu quero me permitir ser querida.


Je veux juste que tu me veux ...
Et donc, je te veux aussi ....
Sans que la peur de la crème glacée,
Pour souhaiter à tous mais en vain ...
Vous ne voulez pas de mépriser mon désirs,
Pour la simple crainte de les voir disparaître
Par mes mains ...
Je veux le voulez sans crainte,
Je veux Queesperar de pouvoir,
Je veux avoir le courage de croire
Que, parfois, nos attentes sont jumelés ...
Je veux me permettre d'être cher.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Cecília Meireles: Se estivesse no mundo (Uma análise teórica)

Olá amigos,
Hoje lhes trago uma pequena análise teórica acerca de uma poesia da excelente poetisa brasileira Cecilia Meireles. Um trabalho que fiz na faculdade, sob avaliação do meu grande professor de Literatura Angelo Grisoli. Agradeço a ele por ter me proporcionado esta passagem - uma passagem para uma profunda viagem, que se chama poesia. Boa leitura a todos!


"Cecília, és tão forte e tão frágil.
Como a onda ao termo da luta.
Mas a onda é água que afoga: Tu, não, és enxuta”.

Assim o poeta Manuel Bandeira define a poetisa Cecília Meireles (1901-1964). Professora, jornalista e poetisa que partilhou da mesma “era da renovação literária no Brasil” com o autor, sendo ambos considerados modernistas. Como ninguém, Cecília soube delinear a faixa invisível do tempo; tempo que fora, para ela, tão visível, tangível... Tempo este que nunca a ludibriou com suas artimanhas. Cecília sempre esteve consciente de quanto as coisas que fazem parte deste mundo, e particularmente, do seu mundo, são breves, passageiras. A relação comparativa de sua vida com suas obras é inevitável. Uma vida marcada pela solidão, pela melancolia. Porém ela, resignada com tal realidade, se diz privilegiada por ter vivenciado essa solidão, sentido essa angústia. Tudo isso se caracteriza como fatores que a impulsionaram a escrever – ou melhor – descrever através de uma singela musicalidade entrelinhas repletas de significação; sinestesias perfeitas da, como bem diz o crítico literário Afrânio Coutinho, “mais alta figura que já surgiu na poesia feminina brasileira e, sem distinção de sexo, um dos grandes nomes de nossa literatura” (2004; pág. 127).

Neste texto, será realizada uma análise teórica de uma de suas centenas de poesias: “Se estive no mundo” (Canções, 1956).




O que mais me chamou a atenção nesta poesia sem pretensão métrica foi a força do existencialismo que nele se encontra. Quem somos? Para onde vamos? Seremos eternos na posteridade humana? O homem quem realmente define sua essência, como diz o filosofo francês Jean-Paul Sartre?

Antes de prolongar a análise, leiamos a poesia para melhor entender essas questões:

Se estive no mundo
Se estive no mundo
ou fora do mundo...?
Mas que lhe respondo,
se o Arcanjo pergunta,
num tempo profundo?
No mundo passava:
porém muito longe.
Por sonhos e amores
me desintegrava.
O mundo não via:
minha permanência
foi, por toda parte,
fantasmagoria.
Dava, mas não tinha.
E, nessa abundância,
nada me ficava:
nem sei se fui minha.
Se estive no mundo
ou fora do mundo?
-Assim me apresento,
se o Arcanjo pergunta
meu nome profundo.

Analisarei, primeiramente, o primeiro verso da poesia. Seu “eu-lírico” é evidenciado logo no primeiro período: “Se (eu) estive no mundo ou fora do mundo?”. O “eu” oculto reforça a idéia que ela imprime no decorrer da poesia. O Arcanjo lhe pergunta “num tempo profundo”, o que pode ser interpretado como “o seu eu mais oculto, mais profundo – o seu verdadeiro eu”. E será justamente este “eu” quem responderá ao Arcanjo nos versos posteriores.

Antes de prosseguir, vale a pena destacar a presença da divina bíblica citada por Cecília: o Arcanjo. Arcanjo significa, segundo a Teologia, “o anjo principal”. De acordo com o livro do Apocalipse, o último livro da Bíblia, os Arcanjos serão os “"Sagrados Cavaleiros, dos Sete Selos, que serão abertos por Cristo, o Messias, prometido por Moisés, desde o Gênesis". Sendo assim, Meireles poderia estar fazendo uma menção subliminar do Juízo Final, que, segundo a Bíblia, será o julgamento do homem, cujos atos praticados durante sua vida na Terra serão todos levados em consideração. Ora, os três versos posteriores ao primeiro soam como respostas “do eu mais profundo” do “eu-lírico ceciliano”; ela estaria sendo julgada pelo Arcanjo que, baseado na integridade de suas respostas, a condenaria ou não”.
Pelo visto, condenada esta não fora; afinal, mostrara “o seu nome mais profundo”, sem máscaras. Despojara-se das vestes humanas. Entregou-se de alma, repugnou o corpo. Desintegrava-se não pelas dores físicas, mas sim, pelos sonhos e pelos amores. O “mundo”, o de carne e osso e máquinas, não foi capaz de enxergar a sua essência. Sua permanência fora invisível aos olhos destes, fora fantasmagórica.

No mundo de hoje, o ser humano se divide em tantas facetas para cumprir suas obrigações, ou simplesmente para persuadir as pessoas. Uma mulher como Cecilia seria mãe, esposa, amiga, professora, escritora... Teria ela sido “ela mesma?” E quanto a nós? O homem consegue, hoje, definir sua essência, uma vez que assimila todas essas experiências num só corpo, numa só existência, num só conjunto de pensamentos (a alma para os clássicos). Entretanto, o homem não consegue ser o que de fato o que ele é, ou seja, ele é todas as construções que ergue dentro si ao longo da vida, e não mais o terreno vazio onde erigira toda esta construção. O terreno, o seu “eu mais profundo”, jamais será retomado. Ou não?

Eis uma imagem do genial pintor surrealista Salvador Dali a qual, segundo minha interpretação, pode ser conjugada com tal poesia de Cecilia:



Este espaço parcialmente vazio, predominantemente branco (cor que simboliza a pacificidade do ser), e a figura de uma mulher e sua sombra são os fortes componentes desta tela de Dalí. A solidão aparente, o vazio, propicia o surgimento de sua sombra. Sua sombra representaria, dentro do contexto em voga, o seu “eu mais profundo”, “aquilo que foge do físico”. O espaço vazio, com exceção de uma montanha mais adiante da mulher, se mostra como o terreno o qual mencionei no parágrafo anterior. Eis uma mulher aparentemente cansada, tomada pela melancolia, refugiada em seu “tempo mais profundo”, descobrindo a si mesma através de sua sombra, pois nada melhor do que a solidão para tal “descoberta”. Um espaço que parece ser infinito, bem como a condição da alma, como aponta a maioria das religiões, acaba por completar a idéia da ausência ceciliana do mundo físico.

No conto “A moça tecelã”, da escritora Marina Colasanti, a personagem “desconstrói” tudo o que havia “tecido” para sua vida; e nesta “desconstrução”, ela reencontra a verdadeira felicidade, que é ser “ela mesma” de novo. Creio que atualmente um dos maiores dilemas do ser humano é ser de fato quem ele é. E Cecília Meireles trata este assunto com uma maestria invejável nesta poesia. De tanto conceder, doar-se, e nada receber em troca, ela nem sabe se foi ela mesma. Ela foi o que os outros, o mundo, a cobrou. A abundância de “seres” a impediu de ser em essência. A efemeridade das coisas, mal que assola o mundo contemporâneo, exige que sejamos várias pessoas numa só vida, sempre vivendo em função de terceiros, de um sistema rígido. Tudo muda em períodos curtos de tempo. Nossa essência se perde sem que nos demos conta, e nossa vida se torna mais um objeto da banalidade.
Uma vez perguntada sobre qual seria o seu maior defeito, ao que Cecilia responde:

Uma certa ausência do mundo. Interessante como esta resposta se encaixa perfeitamente a interpretação dada a esta poesia. Segundo Bosi, “por mundo se entende o fluxo das experiências vividas, tudo quanto foi visto, amado e sofrido; paisagens contempladas, entes queridos, situações de prazer ou de dor”. É justamente deste mundo que ela se ausenta para apresentar a si mesma, o seu “eu mais profundo, o seu tempo mais profundo”. Seria este um defeito? Acredito que não. Se esteve no mundo? Sim, Cecília, tu estivestes em teu mundo, em teu tempo. Ignorastes tudo que se caracteriza como concreto, como mundo de experiência e deixou-se levar pelo etéreo. E por essa condição sublime, decerto que o Arcanjo não há de julgar-te errada, e, por conseguinte, não a condenará.

Talvez seja por isso que Cecília disse, certa vez, que o silêncio e a solidão presentes em boa parte de sua vida foram positivos para ela. Somente na solidão podemos escutar, e não apenas ouvir. No silêncio da solidão, podemos desvendar os pontos mais abissais de nosso ser. Resumindo, podemos, de fato, ser quem somos. Para finalizar, ninguém melhor do que o extraordinário filósofo Nietzsche para corroborar esta idéia, dizendo: “a solidão é o caminho que nos conduz para nós mesmos”.

Referências bibliográficas:

Canções, Cecília Meireles, 1956.
Assim falou Zaratustra, Friederich Nietzsche, 1885.
Céu, inferno, Alfredo Bosi, 1988.
A literatura no Brasil, Afrânio Coutinho, 2004.
Doze Reis e a Moça no Labirinto do Vento, Marina Colasanti, 2000.
Livro do Apocalipse, Bíblia Sagrada.

Físico e Psicológico

Atendendo prontamente a um pedido da Andréa, aqui vai o texto rebelde dessa pessoa aqui. Com pequenas mudanças em relação ao texto no meu blog, com o objetivo de ser mais clara.
Obrigada, querida!
........................................
Físico ou psicológico?
Físico e Psicológico!
Esta pergunta acima era cabível numa outra era de nosso conhecimento.
Quando se utilizou a metodologia científica criada para estudar a matéria para compreender o ser humano.
Mas quando alguém percebeu que o ser humano tinha um modo humano de funcionar e que não poderia ser avaliado somente com métodos científicos desenvolvidos para a matéria, muita coisa mudou.
Por isso, hoje, meus ouvidos doem ao escutar essa expressão: físico ou psicológico? Não doem quando a pergunta vem de um leigo. Doem quando são formuladas por pessoas esclarecidas e que fazem uso dessa pergunta com o intuito de diminuir o sofrimento do outro.
Da máquina podemos responder óleo ou peça. Parafuso ou porca.
Do homem não se pode dizer corpo ou alma, mas corpo e alma.
Porque um mora no outro. Nada acontece a um que o outro não sinta, não sofra.
Então porque não dizer que o sofrimento de alguém não é apenas psicológico, mas humano!
Qualquer pessoa que passe pela dor, pela perda, pela angústia do abandono, da desvalorização, há de sentir a mesma coisa no peito a ecoar no corpo no qual habita...
Sim. Angústia humana afeta o coração, afeta o olhar, o sentir a vida. Desrespeito afeta a voz, a auto-estima, o apreço.
Não. Não dá para separar o corpo da alma.
Por isso não justifiquemos as dores alheias dizendo que são somente psicológicas, só porque não derramam sangue a olhos vistos.
E porque ambos aspectos referem-se à mesma pessoa, a dor é e sempre será física e psicológica.
Ainda que a raiz more numa parte, os galhos estarão sempre na pessoa humana, como um todo, nunca fragmentado, esfacelado.
Esse texto pequenino é apenas um protesto diante da dor de um amigo... Imobilizado há mais de um ano, lutando bravamente para recuperar seus movimentos ou aceitar sua imobilidade.
Quero 'dar a César o que é de César'.
Qualquer ser humano nessas condições sentiria dor e angústia.
Se pudesse (e eu poderia!*) analisá-lo psicologicamente ele foi ótimo até onde suportou. Porque mesmo recebendo um tratamento que deixava a desejar, nunca reclamou, criticou. Mas tendo estressado ao máximo seu corpo, chegando ao limite da dor, suas emoções coerentes com sua vida, revelaram-se inquietas, angustiadas. Ou seja, ele continua sendo a pessoa amorosa, digna e generosa que era, mesmo depois de ultrapassar seus limites de silêncio e equilíbrio frente às suas crises de dor.
Não há porque reduzí-lo ao limite, quando o valor do ser humano é inquestionavelmente maior que seus limites momentâneos.
E a análise tem a função exclusiva de ajudar a compreender, nada mais.
Querido, mais que compreendê-lo, eu o amo!

* Poderia, mas escolhi amar. Amar ultrapassa todo entendimento, já dizia...

Beijo em seus corações,
Claudia